Olá pessoal!! Encontramos um texto super legal de Irandé Antunes em seu livro Aula de Português: encontro e interação e vamos dividir com vocês. Ele está no capítulo Redimensionando a avaliação. Para que fique um pouco divertido, fizemos uma brincadeira: simulamos que estávamos entrevistando a autora Irandé Antunes. Esperamos que gostem!!!
Ellen - Qual a ligação entre o processo de ensino- aprendizagem e a avaliação?
Irandé - No processo de ensino-aprendizagem escolar, o ensino e a avaliação se interdependem. Não teria sentido avaliar o que não foi objeto de ensino, como não teria sentido também avaliar sem que os resultados dessa avaliação se refletissem nas próximas atuações de ensino. Assim, um alimenta o outro – tudo, é claro, em função de se conseguir realizar o objetivo maior que é desenvolver competências nos campos que elegemos.
Lílian - Explique melhor sobre essa interdependência... Ela tem sido valorizada nas salas de aula?
Irandé - Na rotina de nossas atividades escolares, o fio dessa interdependência parece ter-se rompido e, desse modo, avaliação e ensino nem sempre guardam essa reciprocidade. Com grandes prejuízos para o ensino, pois, em muitos casos, a avaliação passou a ser uma espécie de finalidade: a aula é dada para preparar a prova; o livro é lido porque “é pra nota”; a literatura é consultada porque “cai no vestibular”, e assim por diante. Estuda-se para... “uma prestação de contas”, que pode ser mensal, trimestral, anual, no final do ciclo etc. Daí ser o termo “cobrar” uma expressão bem corrente no discurso da escola, o que bem claramente denuncia esse lado mercadológico do ensino. É mais do que oportuno, pois, perguntar-se sobre os “descaminhos” da avaliação e decidir por uma mudança de rumo, mudança que tem suas origens na revisão de nossas concepções. Sim, porque mudar, seja o que for, tem que começar pela revisão de nossos fundamentos conceituais. Se não, muda apenas o palavreado, muda apenas a fachada...
Ellen - Em geral, como são as “avaliações” feitas nas salas de aula do Brasil e com que propósito?
Irandé - Por muitas razões, razões disciplinares inclusive, o processo de avaliação escolar converteu-se num instrumento de seleção dos alunos, apenas conforme os graus (traduzidos numericamente) de seus desempenhos. Com matéria e data marcadas, os “testes”, as “provas” acontecem, exatamente para isso: para que se teste, para que se prove; normalmente, com honrosas exceções, para que se prove o que ficou na memória. Tudo de acordo com a política assumida na hora da aula “dada”: “passa-se” uma informação que é “devolvida” no dia da prova, por vezes, literalmente desenvolvida.
Lílian - Essa visão de avaliação tão antiga, ainda compõe o nosso sistema educacional?!
Irandé - Recentemente, um comercial transmitido pelas emissoras nacionais de televisão me chamou a atenção, pelo modelo de aprendizagem escolar que estava lá sutilmente embutido, inclusive o modelo de professor também. O comercial constava da seguinte cena: um menino está sentado, estudando; a campainha toca e uma voz lá de dentro diz que “deve ser a professora” do filho. De fato, o pai abre a porta, e entra a professora que logo se dirige ao menino, perguntando se ele “aprendeu direitinho a lição”, conforme ela ensinou. O menino diz que sim, e aí a professora começa a interrogá-lo. O menino vai respondendo às perguntas, uma a uma, sem hesitação, com uma certeza dogmática de quem afasta qualquer possibilidade de hesitação, de dúvida ou de questionamento. Tudo transparente, tudo posto, tudo certo, acabado, resolvido, estabilizado. Eu me perguntava sobre que concepções de escola, de aprendizagem, da intervenção do professor passam (naturalmente) pelas peças desse jogo, que de inocente não tem nada. Que concepções de avaliação estão aí implicadas nesse pingue-pongue de perguntas e respostas? Onde é que está o professor que faz pensar, que leva o aluno a perguntar, a contestar, a acrescentar? Que tipo de cidadãos estamos querendo formar com esse procedimento simplista da aceitação pacífica e mnemônica do que a autoridade nos diz? Mesmo que digamos o contrário, essas encenações, as reais e as fictícias, falam da nossa visão distorcida do que seja ensinar e do que seja verificar ou avaliar se o aluno conseguiu assimilar o que lhe propomos.
Lílian - E de que precisamos, a final?
Irandé - Falta rever nossas concepções de avaliação, a fim de desgrudá-las de uma finalidade puramente seletiva – quem passa, quem não passa de ano – e instituir uma avaliação em função da aprendizagem. Uma avaliação, portanto, que seja uma busca dos indícios, dos sinais da trajetória que o aluno percorreu, o que, por outro lado, serve também de sinal para o professor de como ele tem que fazer e por onde tem que continuar.
Ellen - Então, a senhora propõe que os indícios encontrados durante um processo avaliativo representam não só os alunos, mas também os professores?
Irandé - Na verdade, pela avaliação deveria ficar evidente para o professor que coisas ele ainda precisa trazer para a sala de aula como matéria de análise, reflexão e estudo. O professor avalia o aluno para também, de certa forma, avaliar seu trabalho e projetar os jeitos de continuar. Daí que a avaliação não é apenas um evento isolado, previsto no calendário da escola, depois do qual tudo é retomado tal como estava pensado, sem que os resultados alcançados sirvam de algum suporte para futuras decisões.
Lílian - É possível implementar nas escolas brasileiras um sistema de avaliação cujo objetivo seja a melhoria do processo e não só o diagnóstico dele?
Irandé - Felizmente, algumas escolas já têm descoberto novos padrões de avaliação a serviço da regulação das aprendizagens, como propõe Perrenoud (1999:10) e a “tortura” dos dias de prova tem dado lugar a muitas oportunidades para que o aluno se observe e reveja o que pode alcançar em seu desenvolvimento e o que o impediu de fazê-lo com maior êxito.
ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. p.155-158.
Queremos mostrar a vocês que existem realmente escolas preocupadas em mudar as formas de avaliação e suas concepções e o processo de ensino-aprendizagem, como um todo Assistam agora ao seguinte vídeo, retirado de uma matéria do Jornal Nacional do dia 13 de maio de 2011. Veremos que, mesmo em uma instituição cuja estrutura física não é excelente, com vontade, coragem e determinação, o corpo docente consegue mudar as perspectivas dos alunos e seu interesse pelas aulas, o que, consequentemente, acarreta uma melhora do desempenho do estudante.
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